quinta-feira, março 31, 2005

Ciências Cognitivas

Do latim cognitio, de cognoscere, «conhecer».
A expressão está no plural porque se refere a saberes recentes, diversos e, ainda agora, mais ou menos fechados. Se agruparmos, apesar de tudo, esses saberes sob uma certa denominação, é porque têm um objecto comum: a cognição, ou seja, a função psíquica que assegura a recolha, o armazenamento, a transformação e o tratamento das informações que recebemos do mundo exterior, e a partir das quais elaboramos o conhecimento do real. Perceber, raciocinar, aprender, lembrar, falar… são actividades que suscitam interrogações e análises desde a Antiguidade.
Durante muito tempo objectos privilegiados da reflexão filosófica, estas actividades deram origem progressivamente a saberes especializados na investigação de uma ou outra de entre elas, ou de uma ou outra das faculdades humanas das quais depende a sua possibilidade: as neurociências (neurologia, neurofisiologia…), a psicologia, a linguística, às quais se acrescenta hoje a informática, que fornece ao estudo dos mecanismos do pensamento o modelo da «inteligência artificial». O projecto de unificação que leva a qualificar de ciências cognitivas o conjunto dos discursos que tentam descobrir as características e condições de possibilidade da faculdade de conhecer, só se baseia no postulado até certo ponto. Novas ligações poderiam ser evidenciadas entre os diferentes suportes e características dessa faculdade, principalmente no que diz respeito à parte de mistério – que continua a cercar a passagem do cerebral ao mental – que poderia ser reduzida. Como é que o cérebro pode produzir pensamento e conhecimento? Eis, no fundo, a questão para a qual as ciências cognitivas ambicionam encontrar um dia uma resposta única. É a amplitude desta ambição que motiva o procedimento unificador de alguns, ao passo que outros duvidam que o conhecimento do cérebro possa alguma vez reunir-se ao das actividades mentais tais como as entendem a filosofia e as ciências humanas.

quarta-feira, março 30, 2005

As Ciências

Do latim «scietia», derivado de scire, «saber». No seu sentido lato é sinónimo de saber em geral e mesmo de habilidade técnica. Nos gregos epistemé, é um conhecimento simultaneamente eminente (um saber superior), universal (opõe-se ás particularidades) e teórico (difere das aptidões práticas); para os gregos a Filosofia é essa ciência suprema. Para os modernos é um conhecimento científico positivo (a «ciência experimental»), que se apoia nos critérios precisos de verificação permitindo uma objectividade dos resultados.

A filosofia das ciências (ou epistemologia) enuncia alguns problemas:

1. O problema da demarcação. Como é que reconhecemos que um conhecimento é científico? A resposta mais simples é: na possibilidade de o controlar através de factos pela experimentação. Dispomos então de um critério de distinção entre ciência e não ciência. Por exemplo, a filosofia não seria uma ciência, contrariamente ao que pensavam os Gregos, porque os seus argumentos, mesmo racionais, escapam ao conteúdo experimental.
2. A unidade da ciência. Devemos falar da ciência ou das ciências? Existem várias especialidades científicas, a ciência é portanto múltipla nos seus objectos. Mas possui uma unidade de método, sem a qual não poderíamos definir um critério geral que distinga a ciência da não ciência.
3. A classificação das ciências. A unidade do método não impede de classificar as ciências segundo o seu objecto; ex: o quadro enciclopédico de August Comte (positivismo). Por outro lado, essa unidade, apenas diz respeito às ciências experimentais. Não existirão outros tipos de ciências?
Podemos efectivamente distinguir 3 tipos de ciências:
a) As ciências experimentais ou empíricas. Referem-se a um dado objecto na experiência e validam-se através de controlos experimentais.
b) As ciências «formais». São a Matemática e a Lógica, baseadas na dedução a partir de axiomas. Nesta área, não há qualquer necessidade de verificação experimental. Podemos até mesmo discutir aqui o nome de «ciência» visto que, puramente formal, a Matemática e a Lógica não tem objecto exterior à sua construção.
c) As ciências humanas (Filosofia, História, Sociologia, psicologia, etc.). O seu estatuto é bastante controverso. Ou consideramos, com o positivismo que, se merecem o nome de ciências, podemos aplicar-lhes os métodos e a linguagem da ciência experimental: reduzem-se então a um caso especial desta última, ao lado das ciências da natureza. Ou pensamos, ao contrário, com o filósofo alemão Dilthey (1833-1911), que há motivos para distinguir entre «ciências da natureza» e «ciências do espírito» e portanto que, em virtude da particularidade do seu objecto (o homem), as ciências humanas dependem de um outro tipo de processo, fundado não sobre a verificação experimental, mas sobre a interpretação das intenções humanas (hermenêutica).

terça-feira, março 29, 2005

Fenomenologia

Do grego phainomenom, «o que se mostra», e logos «discurso»,«ciência» - Ciência dos Fenómenos.
O termo fenomenologia aparece na obra de Jean Lambert em 1734, com o sentido de «doutrina da aparência». É em seguida retomado por Kant e sobretudo por Hegel que publica a Fenomenologia do Espírito em 1807. Esta última é a história do desenvolvimento progressivo da consciência, desde a simples sensação até à razão universal ou «saber absoluto». Mas foi com Husserl, à beira do séc. XX, que a fenomenologia nasceu verdadeiramente, não tanto como uma escola ligada a uma doutrina ou a um sistema, mas mais como um movimento de pensamento impondo a si próprio a tarefa, sempre renovada, de descrever o que aparece enquanto aparece, graças a um método: o «método fenomenológico».
Quando a consciência está absorvida na crença das coisas, ingenuamente, ignora a essência do fenómeno (do que nos aparece e não do que se "vê"), e então o método fenomenológico consiste num colocar entre parêntesis, numa suspensão de qualquer crença imediata e ingénua na existência das coisas - a chamada epoké - que é uma redução ou recondução desse mesmo fenómeno à consciência como à sua fonte de constituição.
A consciência deve desde logo ser compreendida como um puro acto de «se lançar na direcção de», que Husserl nomeia de intencionalidade: "Qualquer consciência é consciente de alguma coisa". A redução é dita transcendental (do latim transcendere «passar para além», e que independentemente de qualquer experiência torna possível qualquer conhecimento), porque desvela a consciência, e sem isso os fenómenos não teriam qualquer sentido nem qualquer ser.
Husserl (1859 -1938), deixou como discípulos Heidegger, Merleau-Ponty e Max Scheler.

Ideias

Num debate ou explanação como é que se devem trocar ideias, pressupondo que não hajam verdades absolutas, mas sim algumas certezas científicas bem como outras teorias explicativas a considerar?

No caso do assunto ser rotineiro, fútil ou mesmo banal, a opinião (doxa) serve sempre para percebermos que somos todos diferentes, ou seja, não passando da mera opinião o máximo que podemos conseguir é a simpatia de alguns e a antipatia de outros, o que ultrapassando o plano pessoal não leva a mais nada sem ser o prazer duma conversa leve. A doxata só serve para marcar ponto e fazer conversa. Aqui não há grande exigência ou rigor na conversa. "Ganha" em caso de disputa, claro, o melhor orador. Quando não há disputa, "ganha" o mais simpático.
No caso do assunto ser sério e merecer mais esforço de reflexão, deveremos, se queremos esclarecer alguém, elevar o tom do discurso apelando e recorrendo a teorias explicativas e/ou científicas, como "bengalas" (como já vi chamarem)? Ou manter a opinião (doxa) esperando credibilidade sem argumentos?

É preciso não confundir o respeito que se deve ter pelo outro em toda a sua igualdade e individualidade - enquanto ser humano e pessoa com direitos - com as suas opiniões.

Todos erramos, mas nem todos sabemos reconhecê-lo.

sábado, março 26, 2005

O Espaço Público

Vê-se que o espaço público falta cruelmente em Portugal. Quando há diálogo, nunca ou raramente ultrapassa as «opiniões» dos dois sujeitos bem personalizados (cara, nome, estatuto social) que se criticam mutuamente através das crónicas nos jornais respectivos (ou no mesmo jornal).
O «debate» é necessariamente «fulanizado», o que significa que a personalidade social dos interlocutores entra como uma mais-valia de sentido e de verdade no seu discurso. É uma espécie de argumento de autoridade invisível que pesa na discussão: se é X que o diz, com a sua inteligência, a sua cultura, o seu prestígio (de economista, de sociólogo, de catedrático, etc.), então as suas palavras enchem-se de uma força que não teriam se tivessem sido escritas por um x qualquer, desconhecido de todos. Mais: a condição de legitimação de um discurso é a sua passagem pelo plano do prestígio mediático - que, longe de dissolver o sujeito, o reforça e o enquista numa imagem «em carne e osso», subjectivando-o como o melhor, o mais competente, o que realmente merece estar no palco do mundo.
José Gil, in 'Portugal Hoje - O Medo de Existir'

quinta-feira, março 24, 2005

A Culpa dos Males que nos Acontecem

Em todos os males que nos acontecem, olhamos mais para a intenção do que para o efeito. Uma telha que cai de um telhado pode ferir-nos mais, mas não nos desola tanto como uma pedra atirada de propósito por uma mão maldosa. O golpe, por vezes, falha mas a intenção nunca erra o alvo. A dor física é a que menos se sente nos ataques da sorte e, quando os infortunados não sabem a quem culpar pelas suas infelicidades, culpam o destino, que personificam e ao qual atribuem olhos e uma inteligência disposta a atormentá-los intencionalmente.
É o caso de um jogador que, irritado com as suas perdas, se enfurece sem saber contra quem. Imagina que a sorte se encarniça intencionalmente para o atormentar e, encontrando alimento para a sua cólera, excita-se e enfurece-se contra um inimigo que ele próprio criou. O homem sábio, que em todas as infelicidades que lhe acontecem só vê golpes da fatalidade cega, não tem essas agitações insensatas; grita na sua dor, mas sem exaltação, sem cólera; do mal que o atinge só sente os ataques materiais, e os golpes que recebe podem ferir a sua pessoa, mas nenhum atinge o seu coração.
Jean-Jacques Rousseau, in 'Os Devaneios do Caminhante Solitário'

terça-feira, março 22, 2005

Picadelas

Mente-se por tudo e por nada. Mente-se para não incomodar nem afligir, para não se ser demasiado agressivo ou brutal, para não se dar má impressão, para não humilhar o outro; mente-se até para se ser simpático e corresponder ao que o outro ou a situação propiciam.
Notícias Magazine (DN) 2005.01.02
Continuamos a depositar no que se passa fora de nós expectativas enormes e a depreciar o que, bem instruídos e dentro de nós, podemos fazer com o que nos incomoda. Esta externalização excessiva, este quase vício de culpar alguém, penhora o futuro, obedece a uma trama, criteriosa e deliberada, de nos sentirmos sempre pequenos e desamparados, dependentes dos outros.
Notícias Magazine (DN) 2005.01.16

sábado, março 19, 2005

A Moralidade que Liberta

A evolução da humanidade produz a substituição dos instintos e dos impulsos por uma vontade que procura a justiça, por uma vontade que se quer livre e que procura o bem. Por isso é que o direito, fruto da razão, só existe na sociedade humana.
O progresso e o desenvolvimento das sociedades e da vida humana, são fruto do espírito que, consciente do seu próprio fim, procura a justiça e o bem. A evolução mede-se pela virtude moral, porém, a existência, por si só, do direito é algo meramente formal, pois o seu valor reside no grau de aprofundamento das consciências individuais.
À medida que a consciência moral se aprofunda, as acções não são feitas por mero dever mas são guiadas por um querer profundo e íntimo da própria vontade. Não se trata de um mero respeito pela lei, nem de estar apenas em conformidade com ela, mas do querer fazer íntimo que resulta da sua vontade própria. Deste modo, a lei moral perde o carácter de obrigação e transforma-se em puro querer, pura liberdade.

quarta-feira, março 16, 2005

Filosofia Prática

Ser filósofo não é apenas ter ideias subtis, nem mesmo fundar uma escola... É resolver alguns dos problemas da vida, mas em termos práticos.
Henry David Thoureau

Praticar a Filosofia é sondar o temperamento pessoal mas é também, e simultaneamente, uma tentativa de descoberta da verdade.
Iris Murdoch

segunda-feira, março 14, 2005

Insiste Em Ti Mesmo

Insiste em ti mesmo; nunca imites. A todo o momento, podes exibir o teu próprio dom com a força cumulativa de toda uma vida de estudo; mas do talento imitado de outro tens apenas posse parcial e momentânea. Aquilo que cada um sabe fazer de melhor só pode ser ensinado por quem o faz. Ninguém sabe ainda o que seja, nem o pode saber, enquanto essa pessoa não o demonstrar. Onde está o mestre que pudesse ter ensinado Shakespeare? Onde está o mestre que pudesse ter instruído Franklin, ou Washington, ou Bacon, ou Newton? Todo o grande homem é único.

Ralph Waldo Emerson, in 'Essays'

Tornamo-nos Mais Objetivos Depois de Reconhecermos a Nossa Subjectividade

Toda a arte da psicologia ou da ciência da psicologia, se lhe quisermos chamar assim, é baseada numa inversão do processo de objectividade. Não que não possamos tornar-nos objectivos, mas que apenas possamos tornar-nos objectivos depois de termos confrontado as nossas atitudes não objectivas, as nossas atitudes não racionais. Atingir uma objectividade honesta significa termos de saber quais os pontos da nossa natureza que são propensos a determinado preconceito, que parte de nós é defensiva, que parte de nós distorce o que ouvimos. E é necessária uma tremenda auto-honestidade para começar a remover essas distorções e a clarificar a nossa visão. De modo que só podemos atingir a objectividade depois de termos descoberto quais as áreas da nossa psique que não são objectivas.
Além disso, o reconhecimento básico da psicologia é que, lá bem no íntimo, a maior parte da nossa vida é desconhecida da mente consciente e que, quanto mais nos tornamos consciente dela, mais honestos e mais objectivos nos podemos tornar. Nós não vemos os outros com clareza, e o que obscurece a nossa visão são os preconceitos que a pessoa supostamente objectiva se recusa a reconhecer. Uma pessoa objectiva diria que não é responsável pela guerra, mas uma pessoa que sabe psicologia sabe que cada um de nós é responsável porque cada um de nós tem sempre uma área de hostilidade, que depois é projectada para hostilidades colectivas mais vastas.

Anais Nin, in 'Fala Uma Mulher'

domingo, março 13, 2005

Abrangência Literária

Lembremo-nos que a literatura, porque se dirige ao coração, à inteligência, à imaginação e até aos sentidos, toma o homem por todos os lados; toca por isso em todos os interesses, todas as ideias, todos os sentimentos; influi no indivíduo como na sociedade, na família como na praça pública; dispõe os espíritos; determina certas correntes de opinião; combate ou abre caminho a certas tendências; e não é muito dizer que é ela quem prepara o berço aonde se há-de receber esse misterioso filho do tempo - o futuro.

Antero de Quental
in 'Prosas da Época de Coimbra'

Influências

O ambiente e as pessoas que nos cercam são, definitivamente, aquilo que mais influencia o optimismo ou o pessimismo.

Inês Menezes, in Xis (Público)

sexta-feira, março 11, 2005

J. B. Schneewind on the Importance of Context


Context is indeed vital if we are to be historically careful about the meanings of the assertions of past philosophers. For undergraduates, context has an additional kind of importance. Explaining the different sorts of practical problems in which philosophers hoped to make a difference helps students see that what they are reading was not intended to be of merely academic interest. Philosophy nowadays does not have a large appeal to the public, not even to the undergraduate public. If we are to make the history of moral philosophy significant now for students, we need to show them that it mattered in its own time for reasons that went beyond the classroom. What that suggests is that moral philosophy might be as important now as it was then.
(J. B. Schneewind, “Teaching the History of Moral Philosophy,” in Teaching New Histories of Philosophy, ed. J. B. Schneewind [Princeton: The University Center for Human Values, 2004], 177-96, at 191)
Retirado de: Anal Philosopher (só pelo nome vão lá todos... vale mesmo a pena! :)

quarta-feira, março 09, 2005

Comunicação

Muitas vezes não entendemos o significado profundo das coisas porque as retiramos do seu contexto e não percebemos o simbolismo da linguagem.
Isabel Stilwell
in Notícias Magazine (2005.02.27)

Educação

A educação não gera o desenvolvimento. Só a boa educação o faz. A má, aqui como em tudo, é apenas um desperdício de tempo e recursos. A principal diferença entre a boa e a má educação é o bom senso.
João César das Neves
in Diário de Notícias (2005.03.07)

sábado, março 05, 2005

Pensamentos roubados II

Quando se abusa da máscara e ela se cola à pele é uma segunda cara que surge, falsa, a baralhar o espelho e a vida.
Do Jorge.

estou [eu] em máscara [disfarce]
e que dizem dela [escrita] ressalta
ilusão, [sei] talvez ficção [ou orgia]
de tons e toques, de cara em guerra
que se põe [disfarça]… nesta escrita
realça [bela] como só tu [essência]
mas[cara]
© de[mente]

sexta-feira, março 04, 2005

Manuel de Arriaga (n.08.07.1840-f.05.03.1917)

Amanhã comemora-se os 88 anos da morte de Manuel de Arriaga.
Manuel José de Arriaga Brum da Silveira é o 1.º presidente constitucional da República Portuguesa (de 1911 a 1915);
Advogado distinto, poeta, escritor e antigo deputado.
N. na cidade da Horta, na ilha do Faial; era filho de D. Sebastião de Arriaga Brum da Silveira e de D. Maria Cristina de Arriaga Caldeira.
Matriculado no Universidade de Coimbra, na faculdade de direito, fez um curso brilhantíssimo, afirmando-se logo nas lições dos primeiros anos como tribuno, revelando as mais distintas qualidades oratórias a par de não menores qualidades de talento. Esta afirmação parte do segundo ano do curso, quando uma vez, como premiado, deu uma lição a respeito dos direitos do infante D. Miguel de Bragança, direitos que o jovem estudante, valendo-se de todos quantos argumentos pôde, combateu fortemente. Desde os primeiros anos da sua mocidade, habituou-se a um incessante e aturado trabalho, leccionando em Coimbra, conseguindo assim a muito custo, não só fazer a sua formatura, como ainda auxiliar seu irmão mais novo até ao 3.º ou 4.º ano. Terminando o curso, o Dr. Manuel de Arriaga veio para Lisboa e abriu banca de advogado, e, com a fama que já o acompanhava, facilmente se tornou bem conhecido pelas causas de que se encarregava com a maior felicidade, sendo considerado como um dos melhores advogados de Lisboa. A sua fama de tribuno também se tinha acentuado de forma que a cidade do Porto o mandou convidar para orar num comício, ao que ele acedeu, sendo na cidade invicta o alvo das mais vivas demonstrações de simpatia. O Dr. Manuel de Arriaga apresentou-se num concurso para a 10.ª cadeira da Escola Politécnica, e publicou em 1866 a sua dissertação: Sobre a unidade da familia humana debaixo do ponto de vista economico. Fez concurso também para uma cadeira de história no actual Curso Superior de Letras, mas foi preterido por outro candidato. Durante alguns anos regeu a cadeira de inglês no Liceu de Lisboa, onde exerceu com distinção várias comissões; foi um dos vogais da comissão criada por decreto de 26 de Agosto de 1876, para a reformada instrução secundária, e o seu projecto ficou aprovado na generalidade pelo conselho do liceu; está inserto na colecção de respostas mandada publicar pelo governo no ano de 1877.
Ao congresso jurídico reunido em 1889, celebrando as suas sessões plenárias na sala da biblioteca da Academia Real das Ciências, apresentou o relatório de que fora relator: These – O systema penitenciario, quando exclusivo e unico, abrangerá os phenomenos mais importantes da criminalidade, e não os abrangendo, converter-se-ha, numa instituição contraproducente e nefasta? O relatório foi publicado nesse referido ano.
O Dr. Manuel de Arriaga pertenceu ao partido republicano, a que prestou os mais relevantes serviços. Foi um dos seus propagandistas mais entusiastas e eloquentes, e por diversas vezes tendo sido eleito deputado. Os seus discursos foram notáveis, não só pelo brilho e elegância da forma, como pela grande elevação das ideias. Sendo eleito pela ilha da Madeira, advogou tão acertadamente os interesses daquele círculo, que os madeirenses declararam que havia muitos anos não tinham tido em cortes representante mais desinteressado e dedicado. Escreveu muitas poesias apreciáveis, estando umas publicadas e outras ainda inéditas. Também escreveu uma dissertação sobre a necessidade da intervenção das ciências naturais na história universal dos povos para assentá-la em bases positivas e dar-lhe um carácter verdadeiramente científico, a qual foi publicada em 1878.
A política e a advocacia distraíram-no da sua grande vocação para as letras. Não houve um só clube, uma só associação democrática, em que o Dr. Manuel de Arriaga não tenha orado nas suas sessões, sendo sempre escutado com o maior interesse. Também está publicado o discurso que o distinto orador proferiu na câmara dos deputados, na sessão de 23 de Junho de 1890, sobre a questão inglesa.

Obras Principais:
Distinguiu-se principalmente como advogado e orador. Alguns dos discursos políticos ficaram célebres, nomeadamente "O Partido Republicano e o Congresso", pronunciado no Clube Henriques Nogueira em 11 de Dezembro de 1887, "A Questão da Lunda", na Câmara dos Deputados em 1891, "Descaracterização da Nacionalidade Portuguesa no regime monárquico", em 1892, na mesma Câmara, "Começo de liquidação final", "A irresponsabilidade do poder executivo no regime monárquico liberal", e tantos outros. Contos Sagrados, Irradiações e Harmonia Social, constituem exemplos da sua obra como filósofo e poeta.
A experiência como Presidente da República é-nos contada na sua última obra, escrita após a experiência presidencial, intitulada Na Primeira Presidência da República Portuguesa.

quinta-feira, março 03, 2005

Limites

Tal como a tolerância encontra o seu meio termo entre o indiferentismo e o absolutismo, arriscaria defender que também a melhor forma de um professor educar/formar/ensinar, oscila entre estes dois princípios.
Digo a melhor forma - num plano ideal, porque há limites (num plano real) que um professor sabe que não deve, nem pode passar. Este meio termo que deveria ser procurado, muito poucas vezes o é. Poucos professores têm uma verdadeira preocupação pelos alunos e se entregam à causa dispendendo do seu próprio tempo. Mesmo dentro das aulas, e é aqui que quero chegar, poucos se preocupam em fazer mais do que desbobinar matéria. A verdade é que não se pede mais do que isso, mas se se quer formar verdadeiramente jovens para uma profissão e para a vida, a atitude a tomar não pode ser esta.
Tempos em que as pessoas vinham bem preparadas de casa já fazem parte do passado, fruto dos condicionalismos da época - agora o processo actual é outro, de constante informação e de pouca base.

quarta-feira, março 02, 2005

Jean-Paul Sartre (1905-1980)

Sartre foi um dos filósofos mais emblemáticos da 2ª. metade do século XX. Foi professor de Filosofia, em pequenos liceus de província, em França. Logo a seguir à 2ª Guerra Mundial aparece como um dos principais criadores do existencialismo ateu, destacando-se também como romancista, dramaturgo e activista político. Após uma aproximação aos países comunistas, afastou-se das suas posições em 1956, aquando da revolta na Hungria. A sua acção política torna-se então mais individualista. Em 1967 preside ao "Tribunal Russel" e em 1970, assume em França a direcção de algumas publicações de extrema-esquerda. Ao longo da sua vida, foi acusado inúmeras vezes de assumir posições contraditórias com as suas próprias ideias.

Dostoievsky escreve: "Se Deus não existisse, tudo seria permitido".
Aí se situa o ponto de partida do existencialismo. Com efeito, tudo é permitido se deus [qualquer deus] não existe, fica o homem, por conseguinte, abandonado, já que não encontra em si, nem fora de si, uma possibilidade a que se apegue. Antes de mais nada não há desculpas para ele. não há determinismo, o homem é livre, o homem é liberdade.Se deus não existe, não encontramos diante de nós valores ou imposições que nos legitimem o comportamento. Assim, não temos nem atrás de nós, nem diante de nós, no domínio luminoso dos valores, justificações ou desculpas. Estamos sós e sem desculpas.
Jean-Paul Sartre, in O Existencialismo é um Humanismo

Ler mais qualquer coisinha aqui e aqui, sob a orientação da professora Magda Carvalho, actualmente docente da Universidade dos Açores. Mais sobre o existencialismo ali.

Sartre nasceu há 100 anos

Os seus amigos ainda vivos recordam a sua capacidade de dialogar de forma brilhante sobre qualquer assunto, à mesa do Café de Flore, o célebre poiso dos existencialistas que ainda hoje é visitado. Um galã, Sartre era capaz de seduzir as suas interlocutoras (alunas, colegas de faculdade, jornalistas, escritoras) ao fim de poucos minutos de conversa. Apesar de alguns defeitos físicos visíveis, Sartre tinha à sua volta uma corte permanente de admiradoras e nunca escondeu de que forma o fascinava o «continente feminino».

terça-feira, março 01, 2005

Pensamentos roubados

Hoje cheguei à conclusão de que sou milionária nestas quatro paredes do meu quarto. Milionária de ar puro, de sossego, de amor. É muito importante, pelo menos para mim, ser milionária disto tudo. Não me interessam os prédios, as notas ou as moedas. Apenas isto que acabo de dizer.

É bonito, não é?

Da menina que gosta de chocolates e que não gosta que olhem para ela.