quinta-feira, abril 27, 2006

A Diagonal da Vida

"Ao olharmos o caminho que percorremos na vida, ao abarcarmos o seu «erróneo curso labiríntico» (Fausto), não podemos deixar de ver muita felicidade malograda, muita desgraça atraída, e talvez facilmente exageremos nas repreensões a nós mesmos. O curso da vida não é certamente a nossa obra exclusiva, mas o produto de dois factores, a saber, a série dos acontecimentos e a das nossas decisões. Séries que sempre interagem e se modificam reciprocamente. Além disso, há o facto de que, em ambas, o nosso horizonte é sempre bastante limitado, na medida em que não podemos predizer com muita antecipação as nossas decisões e muito menos prever os acontecimentos; na verdade, de ambos conhecemos com justeza apenas os acontecimentos e decisões actuais.
Sendo assim, enquanto o nosso alvo está longe, não podemos dirigir-nos directamente para ele, mas só por aproximações e conjecturas, amiúde tendo de bordejar. Tudo o que conseguimos é tomar decisões sempre segundo a medida das circunstâncias presentes, na esperança de fazê-lo bem, para desse modo nos aproximarmos do alvo principal. Na maioria das vezes, portanto, os acontecimentos e as nossas intenções básicas são comparáveis a duas forças que agem em direcções opostas, sendo a diagonal resultante o curso da nossa vida."


Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida'


... «O Homem é aquilo que sabe» Francis Bacon ou «Sou eu e as minhas circunstâncias» Ortega Y Gasset - ? - Pode ser apenas retórica a pergunta, mas aceitam-se bitaites. ;)

quinta-feira, abril 13, 2006

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É só mais um bocadinho por favor, juramos que ainda estamos deste lado de cá e prometemos mais filosofia em breve.
Beijos e abraços.

segunda-feira, março 20, 2006

Fernando Gil

Dados biográficos Lisboa, 19 Mar (Lusa) - O filósofo português Fernando Gil morreu, hoje, em Paris, aos 69 anos, vítima de doença prolongada, revelou fonte do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.
Fernando Gil, nasceu a 3 de Fevereiro de 1937, em Moçambique, onde fez o liceu. Estudou sociologia, durante um ano, na Universidade de Witwatersrand, na África do Sul, partindo de seguida para Lisboa, onde se licenciou em Direito. Em 1961, parte para Paris, onde se licencia em Filosofia pela Universidade da Sorbonne.
Mais tarde, doutorou-se em Lógica, na Universidade de Paris, de que resulta a publicação da tese «La Logique du Nom». Em 1976, começou a leccionar na Faculdade de Letras de Lisboa, integrando posteriormente o Departamento de Filosofia da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, onde era professor catedrático desde 1998.
Ensinou em várias universidades europeias e sul-americanas, como as Universidades de Porto Alegre e de São Paulo, e na Universidade Johns Hoppkins, em Baltimore. A publicação, em 1984, de Mimesis e Negação, valeu-lhe o Prémio Ensaio do Pen Club, que voltará a receber com Viagens do Olhar, em 1998. Edita ainda Provas, em 1998, Tratado da Evidência, em 1993, e Modos da Evidência, em 1998.
Traduziu para português, autores como Karl Jaspers, Romano Guardini, Cesare Pavese e Merleau-Ponty. Em Lisboa, fundou e dirigiu a revista Análise.
Foi consultor do ministro da Ciência e Tecnologia, José Mariano Gago, e do Presidente da República, Mário Soares, durante os seus dois mandatos.
Recebeu, em 1993, o Prémio Pessoa e foi galardoado com o grau de Grande Oficial da Ordem do Infante D. Henrique, em 1992. A Universidade de Aveiro nomeou-o ’doutor honoris causa’ e o governo francês agraciou-o com o título de Cavaleiro da Ordem das Palmas Académicas.

in Visão Online 20 Março de 2006

segunda-feira, janeiro 30, 2006

Condição Humana

(...) Vivemos, com efeito, na era do ser humano em aberto, a condição humana encontra-se actualmente, no estaleiro. (...)
Se nos quisermos orientar para o exercício duma reflexão crítica e prospectiva é conveniente começar por selecionar uma tese positiva: o estatuto em que a condição humana se encontra, hoje, situa-se perfeitamente no clima temático da modernidade, que pode ser remetido, como se de um momento originário se tratasse, para o diálogo entre Deus e Adão na Oratio (1486) de Pico Della Mirandola: nesse texto o que caracteriza a essência do conceito de humanidade é o seu carácter novo e incompleto, aberto e indeterminado. O ser humano é a criatura que simultaneamente é criadora de si própria. (...)
Se a humanidade não se perdeu, na exacta medida em que ainda não se havia encontrado, porquê então a existência de um mal-estar generalizado, um mal-estar perante o qual a nossa cultura, na multiplicidade das suas manifestações, parece querer desviar os olhos?
As respostas são também múltiplas. Por várias vezes, e de múltiplos modos, perdemos os instrumentos de navegação, e ficámos com o sentimento de que não rumamos para o cumprimento dum destino, mas antes que nos limitamos a andar à deriva.
Passemos em revista breve alguns dos sinais dessa constante perda de bússola, consitutiva do regime em que tem funcionado a cultura moderna:
a) Houve o claro sentimento/percepção de uma mudança de rota: a perda da noção de humanidade associada ao direito natural, como reacção à Revolução Francesa, que conduziu à manutenção do esclavagismo nos EUA, ao imperialismo-nacionalismo e colonialismo europeus, e ao climax de tudo isso no nazismo.
b) Crise da ideia de progresso como ideal-reitor, nas suas múltiplas formas.
c) Ruptura na ideia de confiança cega na aliança da ciência com a tecnologia (Chernobyl e contestação ecológica).
d) Descrença na ideia do papel libertador das instituições (crise do Estado): depois da passagem do Estado soberano, para o Estado nacional, vivemos no dilema de saber se a época que se abre aponta para um Estado cooperativo ou para uma estranha abolição do Estado, um recuo a uma nova era fragmentar?
e) Abandono da tese de um fim-da-história redentor e justificativo. As teodiceias laicas estão em agonia profunda. O que agora se pretende é que a história não acabe...
f) Crise na crença do papel dos valores éticos e solidários como factor de emancipação da humanidade: o testemunho contrário da fome e das múltiplas espécies de segregação subsistentes (nunca houve, simultaneamente, tanta riqueza, nem tanto sofrimento sobre a Terra...).
g) Cepticismo quanto à crença no valor principal da nossa tradição iluminista, quanto à razão como factor de transparência na condução da história humana e no alargamento da esfera controlada pela própria deliberação racional: A racionalidade parece subordinar-se ao primado de uma arquitectura pulsional, que parece estender-se não só ao individuo como à sociedade; parece termos passado da disciplina das paixões ao espectáculo da sua desinibição compulsiva.
h) Perda dos mecanismos de controlo democrático sobre a prospecção construtiva do futuro.
i) Desencanto no choque da globalização como experiência de dezenraizamento e injustiça em vez de comunhão e partilha.
j) Emergência de um profundo sentimento de culpa (mesmo que débil e confusamente formulado) em relação às gerações futuras e em relação às outras criaturas que a intensidade do nosso presente coloca em causa. É aí, aliás, que reside a demanda por um, ainda muito nebuloso, horizonte de desenvolvimento sustentável.
Em síntese: parece ter-se realizado uma das advertências nietzscheanas - perdemos Deus, mas ainda não ganhámos a altura e a distância em que poderíamos dispensar os ídolos.
Já não somos sociedades ávidas de progresso e de futuro, porque tememos a nossa transformação em sociedades devoradoras de futuro.

Viriato Soromenho-Marques (Univ. de Lisboa), Crise Ambiental e Condição Humana. Actas do colóquio Ética Ambiental: uma ética para o futuro. Coordenação de Cristina Beckert. 2001.
*(o negrito no texto é meu.)

terça-feira, janeiro 24, 2006

Conjugar Verbos

Deixo-vos uma sugestão.
Em caso de dúvidas na escrita, mais que não seja para aqueles que se preocupam minimamente com isto, até porque cultura não é só informação, é também saber usar a nossa língua - e já que por aqui todos se lêem uns aos outros, aprendendo (... ou desaprendendo) com isso - faz sentido apelar à responsabilidade em primar pelo mais correcto, e já agora, incondicional e/ou implicitamente, prestar um bom serviço público.
Encontrei este link sobre a conjugação de verbos, que é uma das nossas «desgraças» mais frequentes. Não está muito completo, e por tal, não deve dispensar a leitura a uma gramática, mas já é qualquer coisa para os entretantos.
Muitas vezes se lê, por exemplo: «andasse» em vez de «anda-se» ou vice-versa (entre outros verbos).
É frequente trocar-se o Imperfeito do Conjuntivo (andasse) pelo Presente Indicativo (anda-se) de verbos reflexos (aqueles onde recai a acção no sujeito: «eu lavo-me»; «tu lavas-te»; ...) ou trocá-lo pelo uso da particula apassivante «se» (por exemplo: «Em Portugal anda-se mal»), que substitui uma entidade indefinida.
Também me estive a informar com a Gata Preta que disto sabe muito mais do que eu!
Bom uso e aproveitem para dar uma vista de olhos e tirar dúvidas.

segunda-feira, janeiro 16, 2006

Mitos e Razões

"Uma vez que a lógica não é apenas argumento válido, mas também reflexão sobre os princípios da validade, esta só aparecerá naturalmente quando já existe à disposição um corpo considerável de inferências ou argumentos. A investigação lógica, a de pura narrativa, não é suscitada por qualquer tipo de linguagem. A linguagem literária não fornece material suficiente de argumentos e inferências. As investigações em que se pretende ou procura uma demonstração é que naturalmente dão origem à reflexão lógica, uma vez que demonstrar uma proposição é inferi-la validamente de premissas verdadeiras. Há duas condições para a demonstração, as premissas verdadeiras e os argumentos válidos.
Do ponto de vista lógico, a distinção importante é que a premissa demonstrativa é verdadeira e necessária enquanto a dialéctica não o é necessariamente. Na demonstração começamos com premissas verdadeiras e chegamos necessariamente a uma conclusão verdadeira, por outras palavras, temos uma demonstração. No argumento dialéctico, pelo contrário, não se sabe se as premissas são verdadeiras e não é necessariamente que a conclusão é verdadeira. Se nos aproximamos da verdade dialéctica é por via indirecta.
Existem 3 tipos diferentes de linguagem nas quais se procura ou se exige demonstração. Na matemática pura pretende-se demonstrar verdades abstractas e a priori, em metafísica pretende-se demonstrar proposições muito gerais sobre a estrutura do universo e, na linguagem de todos os dias, especialmente na linguagem política e jurídica, procura-se demonstrações de proposições contingentes."

William Kneale & Martha Kneale - O Desenvolvimento da Lógica (Gulbenkian)


"O mito surge-nos, deste modo, como uma conversão simbólica de atitudes e crenças próprias da consciência comum e/ou do imaginário social efectivo – conversão esta que se processa através de relatos orais colectivamente elaborados e aceites, e que propende, por vezes, a uma justificação a posteriori dos ritos e da própria ordem sócio-cultural vigente, e, de um modo mais geral, a dar (ou antecipar), resposta a inquietações comunitárias frequentemente ainda não formuladas, a respeito dos diversos níveis da condição humana e da sua inserção na ordem cósmica."

Francisco Sardo - Logos e Racionalidade (Casa da Moeda)

domingo, janeiro 08, 2006

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Mostramos ser democráticos, acima de tudo, quando sabemos perder.
É saber aceitar as preferências dos outros e não assumir que a maioria é toda burra.
Iluminados são os candeeiros.