quinta-feira, abril 07, 2005

«Fundamentos para uma Reflexão Ética em Merleau-Ponty»

Para quem goste de Merleau-Ponty e de António Damásio, deve consultar um excelente artigo do Dr. Jorge Dias aqui e ler outros igualmente interessantes na Metacrítica.

"A distinção entre doenças do cérebro e da mente, entre problemas neurológicos e psicológicos ou psiquiátricos, é uma herança cultural infeliz que penetra na sociedade e na medicina e reflecte uma ignorância básica entre o cérebro e a mente. As doenças do cérebro são vistas como tragédias a quem não se pode atribuir culpas, enquanto que as doenças da mente, no comportamento e nas emoções, são vistas como inconveniências sociais nas quais os doentes têm muitas responsabilidades. Aqui, a falta de força de vontade é o problema primário".
Cfr. António Damásio, O Erro de Descartes, p.60.

9 comentários:

«« disse...

Damasio e um conjunto de neuro-cientistas ( nos quais se deve incluir mais portugueses, dos uais um que tem como sobrenome Coutinho) são responsaveis porque hoje se chame ignorante quem pensa da forma tradicional....pois deram a "volta" a um conhecimento desconhecido. Este tema é fantástico...tive o prazer de ler os tres livros do autor e mais uns quantos artigos que encontrei em várias revistas ...é de facto um mundo que terá que ser explorado de forma prática, sob pena de continuarmos, por exemplo, a cometer barbaridades com os nossos alunos

RD disse...

Miguel, julgo que não o percebi.
Será por ele ter achado que o modo tradicional de pensar tenha sido passado sem ter sido pensado? É isso?

RD disse...

Se me interessa o conhecimento humano e o estudo do seu agir, não faz sentido escolher leituras que apenas "dêem jeito" para reforçar um lado, tento ler tudo o que esteja relacionado com o assunto, porque o meu objectivo é conhecer e não reforçar convicções. Sei admitir mudanças de pensar quando assim se justifica.
O que quero dizer com isto caro amigo, é que até o Zaratustra foi bem filtrado e não abalou em nada com a minha fé, pelo contrário, devo dizer que até a reforçou. A fé é também racionalizada ao máximo por muitos filósofos e teólogos, e apesar de se pensar o contrário, há argumentos muito válidos. A título de exemplo, leia-se Santo Agostinho, St. Anselmo, S.Tomás de Aquino, Espinosa e entrando nos nossos amigos existencialistas - Jaspers, entre outros. A fé depois de contrabalançada com todo o tipo de explicação racional (que não é o caso de Nietzsche - pensamento abdutivo) pode de facto firmar-se ainda mais, mas aí já depende da exigência de fundamentação pessoal e garanto-lhe que a minha é alta e sem qualquer tipo de preconceito nesta matéria. Está-se sempre a aprender mas de preferência que se o faça de livre espírito, com ingenuidade e sem ideia fixa senão bloqueamos qq entrada que não venha ao encontro das nossas supostas convicções.
São discussões a ter com muito cuidado e rigor, e esta só a tenho pessoalmente, como aliás faço também para a política.
Sendo assim Paulo, não há qualquer perigo de mudança no nome do blog nem no que diga respeito, quanto a mim, no "negócio" da cristandade ou catolicismo.
Um dia em companhia do tal vinho que se perdeu entre posts, terás que me contar pessoalmente onde te situas nesta matéria e porquê, bem sabes que gosto sempre de ouvir todos os lados, e acreditando que sejas exigente como penso que és, deves ter boas explicações sem serem as comuns que me parecem ser tanto ou mais metafísicas que o contrário.
Já pensaste qual a lógica de quem não acredita, tentar provar a quem acredita, sobre algo que defendem que não se conhece (Deus)? No entanto todos O pensam. Irónico não é?
No entanto, se falarmos sobre a mensagem (e não sobre a entidade) a coisa já muda, não concordas?

RD disse...

O René estampou-se ao comprido porque se fechou em si mesmo, caiu num solipsismo que não o permitiu fundamentar o conhecimento das coisas, dos outros, do mundo. Percebeu parte do problema de pensar mas não explicou a ligação com o conhecer. Após a redução (epoché), não soube (ou não pensou em saber) qual o processo de conhecimento para o restante todo. Importante na mesma tudo o que nos trouxe este senhor, porque a genialidade de Husserl e da fenomenologia, consiste em aproveitar essa redução ao eu puro, ao ego (H. aproveitou apenas o método, não a filosofia de D.) e dar substracto ao conhecimento após a ideia ter entrado na consciência. Ou seja, só conhecemos a partir da altura em que damos sentido às coisas, a partir da altura em que elas se tornam pertença da nossa consciência e pela intencionalidade do sujeito após epoché. Um desdobramento no processo do conhecimento que ao mesmo tempo que estamos a ter consciência de conhecer estamos a dar sentido às coisas e a conhecer efectivamente - um encher da consciência que antes estava vazia. Há portanto um conhecimento de nós e do mundo ao mesmo tempo, mundo este que existe para nós à medida que o pensamos senão o mesmo não faria sentido. Heidegger vem contrariar e com muita razão, mas essa é outra história que não se entende sem que se saiba desta antes.

Autre bise pour toi :)

Anónimo disse...

Rosa.

Longe de mim querer "converter" seja quem for. Nunca tive jeito, nem pretensões, para missionário desalinhado. Nada disso.

Estava a ser irónico, embora a ironia seja uma forma sublime de se dizer a verdade, é certo.
Admito que o meu enjoo por este "marketing" religioso, que se tem vindo assistir estes últimos dias na comunicação social (sem querer retirar qualquer mérito à grande figura diplomática que foi Karol, mas ainda assim um homem, e não um Deus-na-terra) talvez possa ter sido ofensivo para quem é crente. Não foi essa a minha intenção.

Mas agora não respeito é este fundamentalismo religioso; este aproveitamento dos media; a continuada deslaicização do Estado (com o Presidente da República a oferecer o Falcon do Estado para sua eminência o Cardeal Policarpo ir directo para o Vaticano).
Há que ser coerente, com as nossas convicções e como vês, nem todos o são.
Mas já estou a fugir à tua resposta.

Acho muito bem que continues com o método de não selecionares autores consoante a tua preferência. Mas sejamos francos: há autores e há autores, e há quem nos diga mais e quem nos diga menos.
Se reforças a tua fé ao leres Nietzsche, pois então só posso dizer que o teu filtro é colossal. Não vejo onde podes retirar da apologia do (super) homem qualquer reforço à fé, quando é isso precisamente que ele combate (os fardo do camelo, o rugido libertador do leão, e o nascimento da criança). Mas de filosofia percebes tu, e aqui ando em pântanos movediços.
Mas pronto, pronto. Amigos na mesma. Não fiques arreliada.
Até porque fé, é a única coisa que não discuto.

Por fim, respondendo à tua última provocação, eu digo: não tem lógica discutir o que não tem lógica por natureza. Fé lógica?
Se é verdade que todos O pensam, a inversa também não é verdadeira? Não será que também todos DELE duvidam? E daí a necessidade de expurgação dos nossos pecados? O sentimento de culpa da violação do dogma instituído?

Não sei Rosa. Especulo. Apenas especulo.


PS: «In Vino Veritas», ainda não me esqueci. Tens sempre o mail das Aventuras para deixares a data, o local, a hora, e o tema a discutir.
Eu levo os vinhos.

RD disse...

Paulo, desculpa se te dei a entender isso, passei-te mal a mensagem, mea culpa. Inconscientemente também devia estar um pouco incomodada com a polémica que roda o assunto ultimamente, mas a minha resposta não era no sentido de te picar.
Senti-me talvez na obrigação de fazer uma apologia ao respeito entre crenças, já que uma e outra, são inúteis de discutir, mas a discuti-las - que se faça com informação. Tb não sou expert, de forma alguma, sou apenas uma interessada. :)
O Papa, chamado de Sumo Pontifice, ou "aquele que faz a ponte com a divindade", não é Deus claro, mas é a sua representação cá, e como homem que é (foi), é falível mas deu o seu melhor.
Não me ofendeste nem estou arreliada, foi ataque meu sem dar conta :| Às vezes escrevo "á seca" pensando que posso e esqueço-me que não me conhecem desse lado. Dá nisto. Espero que me comeces a entender melhor neste sentido pq não é por mal.

O grande problema é esse, o aproveitamento dos media. Esses subvertem tudo sem que as pessoas se apercebam e são eles a verdadeira religião e ópio do povo. È demais esta construção exagerada que eles teimam em manipular e o povo ainda mais ingenuo, que se deixa levar.

Quanto ao presidente da República, creio que aqui outros interesses se levantem. Não é em função da religião, como sabes o dito é ateu, mas do prestígio do país (ou algo que não atinjo) e que até pode ser mera solidariedade.
Mas fica-lhe mal, fica pois. Essa separação já foi feita por Maquiavel há muito tempo.

Há autores que me dizem muito mais que outros, claro, mas para saber disso tenho que ler os dois para saber quem tem mais razão ou mesmo retirar razão aos dois. Agora, não abafo ou escondo nenhum, isso seria medo de não ser refutada.

Paulo, de Nietzsche retira-se muito. Gosto em especial da mensagem de "desencarneiramento" e da vitalidade e genialidade do homem que está mal aproveitada por conveniências, medos e etecêteras, gosto do amor que Nietzsche tem pelos clássicos gregos, pelo confronto de opostos representado por Apolo e Dionisio. Pela Vida exultada em toda a sua possibilidade. Nietzsche é fantástico quando não levado a extremos e "lido em braille", o homem apesar de ter crises de demência era genial.
Porque não tentarmos ser Super-Homens? Não será isso ter fé em nós? (Vê se me interpretas isto a bem, não vás pensar que eu ando na droga!) ;) Eu acredito em Deus mas não que eu dependa dele ou que ele seja responsável pelo rumo da minha vida.
Nietzsche apelida-se de amoral mas no fundo é imoral porque é a religião de Deus que contraria (podia ser outra qq), e consequentemente, tenta com o seu profeta Zaratustra criar outra religião. Ora, qualquer ser imoral tem outra religião, nem que seja a sua, mas tem. Se não tivesse era amoral.
Gosto bastante dos três estados do homem: o camelo que carrega fardos, o leão que se liberta e o regresso á ingenuidade infantil - a criança, mas atenção que para se voltar a sê-lo é preciso passar-se pelo resto - é o eterno retorno, não pelo tempo físico mas relativo ao conhecimento. Aplicam-se na prática se assim o quisermos.
O que não vai de encontro ao cristianismo é a não-humildade de Nietzsche, mas também a que há, não é a defendida pela religião, é a praticada e adulterada pelos séculos - e essa também eu não a pratico.
É melhor nisto pararmos por aqui, tenho interpretações diferentes das que se espera ler e não é por aqui que posso explicá-las, corro o grave risco de ser mal interpretada em vão e tenho consciência disso.

Tudo o que é tudo acaba por não ser nada, e vice-versa.

Quem não acredita, não tem direito por lógica a ser perdoado, já que depende de si mesmo e não tem qq fundamento a que se "agarrar", também não deverá ter sentimento de culpa já que estes valores não são os seus. O conceito "perdão" e "culpa" nascem pela mão da religião católica.
Eu nisto, e pela responsabilidade que atribuo ao homem que é um ser dotado de razão, não acredito em perdão como instrumento de limpeza automática de consciência, acredito sim na possibilidade que temos de fazer melhor e bem, para não termos que precisar de perdão. As minhas culpas são só minhas, e é daí que advém mais responsabilidade, mas isto sou só eu e as minhas circunstâncias.
Especulações e Existencialismos. ;)

ps: o sr. dr. será informado com a devida antecedência do tema a discutir. não quero que venha despreparado. ;)*

Besito.

RD disse...

Lembrei-me de dizer outra coisa que é importante esclarecer. Ainda sobre o conhecimento e na passagem da linha de Descartes para Husserl, é importante saber que houve pelo meio uma revolução apelidada de copernicana, revolução esta feita por Kant. Antes pensávamos que conhecíamos pela relação objecto-sujeito, ou seja, de fora para dentro. Eram as coisas que nos afectavam e não o contrário. A partir de Kant, a conversa é outra. Sabe-se agora que se conhece pelas estruturas do sujeito, a começar pela sensibilidade, entendimento e depois conhecimento e razão, processo que se interliga pela imaginação, houve a mudança para sujeito-objecto, de dentro para fora. Muda muito. Daí a importância dada à consciência. Mais tarde aparecem os chamados filósofos da suspeita - Freud, Nietzsche e Marx e tem-se em conta também a inconsciência no conhecimento. Não deixando contudo de ser pela consciência que se dê o processo de inteligibilidade.
Foi só um aparte.
Até breve. :)**

RD disse...

PSS: Os vinhos? Parece coisa para ser pela noite dentro. ;)

Anónimo disse...

Rosa, "tá-se bem".

Depois, uma boa tertúlia nunca acaba antes das 03.00.