sábado, outubro 22, 2005

Dignidade Humana

"Em resumo, o termo Dignidade Humana é o reconhecimento de um valor. É um princípio moral baseado na finalidade do ser humano e não na sua utilização como um meio. Isso quer dizer que a Dignidade Humana estaria baseada na própria natureza da espécie humana a qual inclui, normalmente, manifestações de racionalidade, de liberdade e de finalidade em si, que fazem do ser humano um ente em permanente desenvolvimento na procura da realização de si próprio. Esse projecto de auto-realização exige, da parte de outros, reconhecimento, respeito, liberdade de acção e não instrumentalização da pessoa. Essa auto-realização pessoal, que seria o objecto e a razão da dignidade, só é possível através da solidariedade ontológica com todos os membros da nossa espécie. Tudo o que somos é devido a outros que se debruçaram sobre nós e nos transmitiram uma língua, uma cultura, uma série de tradições e princípios. Uma vez que fomos constituídos por esta solidariedade ontológica da raça humana e estamos inevitavelmente mergulhados nela, realizamo-nos a nós próprios através da relação e ajuda ao outro. Não respeitaríamos a dignidade dos outros se não a respeitássemos no outro.
Na ética moderna, a dignidade humana exprime-se em um 'nós-humanidade' que não é a soma dos 'eus' individuais. Segundo Levinas, "'nós' não é o plural de 'eu'". O ponto de partida para a expressão dessa dignidade situa-se na totalidade dos seres humanos e por isso foi possível afirmar-se que enquanto um ser humano não for livre, nenhum ser humano será livre.
A socialização não é porém uma diluição do 'eu' no conjunto da comunidade humana. Como vemos todos os dias, todo o ser humano aspira a repetir o seu "paraíso perdido", que foi a fusão total com a mãe. Daí a procura, por vezes desenfreada, de uma relação dual. Ora, o indivíduo acede à sua condição de ser único quando torna possível essa passagem da fusão com a mãe à autonomia. É a aprendizagem do 'eu/tu' que Martin Buber tão eloquentemente descreveu e onde alicerçou as condições indispensáveis para a alteridade efectiva. Quanto maior e mais alargado for o número de pessoas com quem estabelecemos a relação 'tu/eu', maior é a nossa participação na noosfera e mais forte é a nossa dignidade humana.
Foi esta noção de uma camada de humanos que envolve toda a Terra que Teilhard de Chardin chamou a noosfera. Ela é interdependente da biosfera e da atmosfera. A evidência desta afirmação encontra-se no nosso quotidiano (vivemos das espécies biológicas e respiramos porque imersos na atmosfera). Mas também a encontramos em certas manifestações religiosas que têm marcado profundamente algumas civilizações. Assim, por exemplo, no Budismo não há separação entre o humano e toda a realidade natural que o rodeia. No nosso tempo, esta interdependência é sentida através da acção nefasta do humano sobre a biosfera e sobre a atmosfera. Daí poder inferir-se que a contribuição para a integridade e diversidade das espécies biológicas e para o equilíbrio da atmosfera é, afinal, também contribuir para a defesa da dignidade humana."

Prof. Doutora Teresa Joaquim, in Documento de trabalho: 26/CNECV/99;
REFLEXÃO ÉTICA SOBRE A DIGNIDADE HUMANA

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