segunda-feira, novembro 29, 2004

Tolerância

Se a esperança para a resolução de todos os conflitos à escala mundial fosse a tolerância, bem poderíamos perdê-la, pois a tolerância por si só não basta. Não há um consenso global sobre assunto algum e portanto esta é entendida de formas diferentes e com alguma confusão. Há que, cada vez mais, defini-la e dar-lhe sentido.
Formalmente, tolerância, consiste pois, “(…) em nos abstermos de intervir na acção ou opinião de outros, mesmo que o possamos fazer ou que desaprovemos ou não apreciemos a acção ou opinião em questão. A tolerância relaciona-se, de forma essencial, ao que é desagradável, que não nos dá prazer e é moralmente repreensível.”¹
Assim sendo, como devemos agir? Aceitando tudo o que nos é adverso, contrariando os nossos princípios, de forma a que se mantenha a harmonia entre diferenças? Ou discordar, assumindo uma posição de crítica ao outro e cair na possibilidade de criar conflito?
Este é um assunto deveras complexo para ser descrito, a título de exemplo, com duas (aparentemente) simples perguntas. O que há a perceber logo de início, é se devemos agir ou não. O não agir é também uma forma de tolerância e presume uma aceitação pelo acto em questão.
Seguidamente temos que perceber que temos legitimidade e autonomia para agir e não há lei nenhuma que diga que tenhamos que ser tolerantes. Assim, a tolerância é uma forma voluntária de acção que presume um equilíbrio entre o bom senso e o conhecimento científico. Casos há em que a tolerância não é admitida e isto porque ela tem os seus limites.
Em casos moralmente repreensíveis alegar tolerância na dimensão da religião é mais difícil, pois apesar das diferenças entre religiões e consequentemente entre valores morais das mesmas, até os indivíduos que não tem religião tem regras de acção diferentes entre si, e sendo assim, a nível social, quando a situação não nos agrada simplesmente ou não nos dá prazer temos tendência a não nos imiscuir nas mesmas. Então como avaliar a tolerância? Como uma virtude ou como um valor?
Se é uma virtude ser-se tolerante, torna-se nula se não o formos. Se é um valor, temos que agir segundo o mínimo de regras de acção, mantermo-nos informados sobre as condutas que legitimem a tolerância.
Encontrar o equilíbrio tem sido o “ouro dos alquimistas” ao longo dos últimos tempos. Há quem defenda que enquanto não houver diálogo entre as religiões, não haverá tolerância que supere os conflitos, mas estamos em crer que a esperança está na pessoa.
É pelo processo de respeito aos direitos humanos, que internacionalizado, abrirá portas para o crescimento da consciência moral social e individual. Passando pela educação, alteridade, responsabilidade e liberdade, o individuo crescerá a respeitar o outro como seu igual e assim aceitar a diferença. Aceitar a diferença que haverá sempre, não significa perder identidade, significa adequação e sintonia com outras realidades e/ou vivências partilhadas.
O mundo civilizacional está a passar as maiores crises de sempre, desde a falta de educação do dia a dia ao terrorismo. O caos aproxima-se e se não tomarmos medidas radicais e bruscas cairemos num percurso irreversível, sem retorno. As prioridades estão trocadas, não há respeito por nada nem por ninguém. Caiu-se num pós-dever, num individualismo que não é responsável, que prejudica a própria pessoa e mais grave, os outros.
É preciso compreendermos que qualquer acção que tenhamos terá consequências em nós e nos outros, desta forma, isso torna-nos responsáveis por todos implicitamente.
Assim, a consciencialização individual e social tem que ser formada pois quem não souber pensar bem, não pode contribuir para que uma sociedade seja produtiva ou progrida.


1 - Canto-Sperber, M. (dir), Dictionnaire d’Ethique et de Philosophie Morale. Paris, P.U.F., 1996, pp. 1536-1537.

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