Pessoa
A pessoa é uma noção simultaneamente jurídica e moral. Designa o homem enquanto sujeito consciente e racional, capaz de distinguir o bem do mal, o correcto do errado, o verdadeiro do falso, e podendo responder pelos seus actos ou pelas suas opções. A ideia de pessoa é-nos hoje familiar. O respeito e a dignidade da pessoa humana são universalmente admitidos e constantemente reafirmados, ao nível dos princípios. Portanto, a ideia de pessoa é complexa, tal como testemunham os debates éticos contemporâneos. Este conceito elaborou-se, progressivamente, a partir de diversas fontes históricas; simultaneamente religiosas, jurídicas e filosóficas.
As fontes históricas:
Na sua origem, a palavra persona (do latim personare, «soar através») designava a máscara por detrás da qual o actor desaparecia para desempenhar um papel, uma personagem. Ora, a personagem refere-se logo a uma função e a uma dimensão pública. É talvez por isso que o termo de pessoa tomou depois um sentido jurídico e serviu para designar, em direito romano, aquele que tem uma existência civil e direitos, em oposição ao escravo que nada tem.
Pessoa e identidade:
A identidade pessoal é simultaneamente certa e impenhorável. A pessoa não é uma substância mas, sim, um princípio de coesão e de coerência. Apesar da diversidade dos seus pensamentos e dos seus actos, cada um pode, porque a consciência os acompanha sempre, reconhecer-se como autor e julgá-los. Ser uma pessoa, é ser dotado de consciência e de razão.
A pessoa como valor:
É porque é uma pessoa que o homem é sujeito de direitos, ou seja, capaz de tomar decisões que o comprometam. Foi preciso esperar pela Declaração dos Direitos do Homem, em 1789, para que o estatuto jurídico fosse reconhecido a todos os homens. Se os homens são iguais em direito, é porque eles também têm o mesmo valor. A Declaração dos Direitos do Homem não tem apenas um significado jurídico, como também tem um significado moral. Mas é com Kant que a pessoa se torna uma categoria moral. A pessoa é de facto não só um sujeito de direitos, mas também um objecto do dever. A pessoa tem, segundo Kant, um valor absoluto, e existe como fim em si, em oposição às coisas que têm um valor relativo e as quais podemos usar como simples meios. O princípio do respeito absoluto da pessoa exprime-se através do imperativo categórico que pode formular-se assim: “Age de tal forma com a humanidade para que a trates, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre como fim, nunca simplesmente como um meio”, ou seja, faz aos outros o que queres que te façam a ti.
Reconhecer à pessoa um valor e uma dignidade absolutos, é ultrapassar a simples afirmação dos seus direitos. É dizer que ela deve ser protegida e respeitada, mesmo quando é impedida ou incapaz de agir livremente.
É uma afirmação à qual não podemos negar a legitimidade, mas que acarreta tremendos problemas éticos, como podemos constatar nas discussões actuais sobre a eutanásia ou o estatuto do embrião humano. É por isso que é mais do que nunca necessário continuar um trabalho de reflexão e de elucidação que permita clarificar um debate, onde as fontes religiosas, jurídicas e filosóficas da noção de pessoa continuam por vezes a exercer a sua influência despercebida e talvez contraditória.
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